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Pagamento por valor: onde estamos, o que realmente aprendemos e o que ainda não sabemos

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Quando falamos de pagamento por valor, é fácil cair na tentação de tratar o tema como receita de bolo. Eu mesmo já participei de reuniões em que a conversa parecia um manual: padroniza protocolo, define indicador, alinha incentivo. Na prática, a realidade é menos limpa. Cada organização tem história, cultura, desenho de rede, gargalo logístico e limitações bem concretas. Por isso, antes de dizer como deveria ser, vale reconhecer onde realmente estamos.


No cenário internacional, o movimento existe há anos, mas também não é homogêneo. Nos Estados Unidos, programas de pagamento por episódio buscam responsabilidade compartilhada sobre qualidade e custo. O princípio é relevante: enxergar o cuidado como jornada, não como atos isolados. Mas os resultados variam muito entre linhas de cuidado e contextos regionais. No Reino Unido, o ajuste de modelos com componentes fixos e variáveis tenta equilibrar previsibilidade e incentivo à melhora. A OCDE aponta que pagamento por valor só se sustenta quando existe capacidade de medir desfecho e experiência do paciente de forma consistente. Ou seja: a teoria é clara, a prática depende de sistemas que sabem medir.


No Brasil, a ANS colocou o tema na agenda institucional desde 2019. O Programa de Modelos de Remuneração Baseados em Valor foi uma tentativa de criar linguagem comum entre operadoras e prestadores. A RN 630, em 2025, reforça que qualidade e desfecho passam a ser parte da conversa de acreditação. Não é ruptura. É sinalização. É reconhecimento de que só discutir preço e glosa não resolve o problema do setor.


Para quem está à frente de hospital ou rede, isso chega como dilema concreto. Aceitar um contrato por episódio significa acreditar que a organização consegue entregar previsibilidade clínica ao longo da linha de cuidado. Isso envolve coisa muito menos glamourosa do que estratégia: envolve fluxo, prontidão, tempo de resposta, coordenação real entre equipes. Capitation é ainda mais sensível porque transfere risco populacional ao longo do tempo. Só faz sentido quando há estratificação de risco confiável e atenção primária capaz de atuar antes da agudização. Do contrário, vira exposição financeira.


Quando falo em separação entre preço, risco e métrica, não é fórmula. É tentativa de trazer clareza: o contrato só funciona quando todos entendem qual risco está sendo assumido, qual resultado se quer observar e como ele será medido. No dia a dia, isso significa discutir critério de inclusão, exclusão, janela temporal, ajuste de gravidade e rotina de revisão conjunta. Nada disso é novidade para quem está na operação. A questão é que, sem isso, o discurso de valor não se sustenta.


E onde entra a IA nessa história? Não como solução mágica. IA não resolve governança clínica. Mas pode ajudar a tornar o risco mais legível. Identificar quem está prestes a descompensar, antecipar um episódio adverso, orientar navegação de paciente complexo. Em pagamento por episódio, pode apoiar preparação e recuperação mais previsíveis. Só que isso só funciona quando existe integração real de sistemas e dados utilizáveis. IA sem dado estruturado e sem telemetria vira ferramenta isolada, não componente de contrato.


Se existe um erro recorrente no país, ele está na pressa. Adotar bundle sem testar com dado local. Assumir capitation sem medir risco clínico ao longo de meses. A consequência é quase sempre a mesma: sofrimento financeiro e descrédito do modelo. O caminho é mais paciente. Escolher linhas de cuidado maduras. Testar. Medir. Ajustar. Expandir quando fizer sentido.


Internamente, talvez o ponto mais sensível seja incentivo. Se a organização recebe por valor, mas remunera equipes por volume, o resultado não muda. O incentivo interno precisa refletir coordenação, qualidade, redução de variabilidade e desfecho. Esse alinhamento não é simples e exige conversar sobre prática real, não sobre ideal.

Quando olho para os próximos anos, o que vejo não é substituição repentina de fee for service. Vejo convivência. Vejo contrato híbrido. E vejo que quem tiver capacidade de medir de forma transparente vai negociar melhor. Pagamento por valor não é solução mágica. É maturidade de sistema. É capacidade de enxergar o que está acontecendo com o paciente ao longo do tempo e assumir responsabilidade por isso.


No fundo, é menos sobre modelo e mais sobre como a organização pensa o cuidado. Jornadas contínuas, não eventos isolados.


Fontes consultadas:

  1. CMS. Modelos de pagamento por episódio e responsabilidade compartilhada.

  2. NHS England. Estrutura de pagamento 2025/26 e mecanismos combinados.

  3. OCDE. Modelos de pagamento para promoção de valor em sistemas de saúde.

  4. ANS. Programa Modelos de Remuneração Baseados em Valor (2019).

  5. ANS. RN 630/2025 e orientações para acreditação e qualidade.


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